domingo, 11 de março de 2012

A ASCENSÃO DE JESUS – Parte 2


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A ASCENSÃO DE JESUS – Parte 2
Então, os que estavam reunidos lhe perguntaram: Senhor, será este o tempo em que restaures o reino a Israel? Respondeu-lhes: Não vos compete conhecer tempos ou épocas que o Pai reservou pela sua exclusiva autoridade; mas recebereis poder, ao descer sobre vós o Espírito Santo, e sereis minhas testemunhas tanto em Jerusalém como em toda a Judéia e Samaria e até aos confins da terra. (Atos 1:6-8)
Não vos compete conhecer tempos ou épocas: As duas palavras gregas representadas por estas traduções às vezes são consideradas sinônimas. É sempre difícil estabelecer uma distinção clara entre uma e outra. Aqui, todavia, tempos (gr. chronous) é palavra usada com o sentido de períodos de tempo ou eras da história do mundo; e épocas (gr. kairous) seriam os momentos críticos dentro dessas eras da história. 

Não foi esta a primeira vez que os discípulos perguntaram a Jesus o que estava por vir e, como das outras vezes, o Senhor não lhes deu resposta. Em vez disso, Jesus lhes focalizou a atenção nas obrigações atuais (compare Jo. 21:21 e seguinte). O futuro está nas mãos de Deus, e não lhes competia saber o que o futuro lhes traria, pelo menos não em minúcias (compare Mc. 13:32). A obrigação dos discípulos era a de serem testemunhas (At. 1:8).
Ao descer sobre vós o Espírito Santo: A expressão grega aqui pode ser traduzida de duas maneiras. O caso genitivo do Espírito Santo pode relacionar-se a poder, dando o sentido de "vós recebereis o poder do Espírito Santo que descerá sobre vós" (compare Lc. 4:14; Rm. 15:13, 19), ou pode ser tomado como genitivo absoluto com sentido temporal.
Tal comissão obviamente representou uma referência especial aos apóstolos que autenticariam de modo singular os fatos principais do evangelho — a vida, a morte, a ressurreição e a ascensão de Jesus. Neste sentido eles eram os alicerces e pilares da igreja (compare Mt. 16:18; Gl. 2:9). Mas a igreja edificada sobre tais alicerces se tornaria em si mesma "a coluna e esteio da verdade" (I Tm. 3:15). É aqui que se aplica a referência secundária das palavras de Jesus. Nem todos são apóstolos, mas todos estão comissionados para testemunhar a verdade que estabeleceram. A todos, pois, é feita a promessa: recebereis poder, ao descer sobre vós o Espírito Santo (At. 1:8). As declarações deste versículo devem ser entendidas como causa e efeito. Só pode haver testemunho eficaz onde estiver o Espírito e, onde estiver o Espírito, seguir-se-á testemunho eficaz em palavras, em obras (milagres), e na qualidade de vida daqueles que o receberam.
A ordem do Senhor tem um escopo universal. Partindo de Jerusalém, os discípulos deveriam sair até os confins da terra (At. 1:8). Em Jerusalém como em toda a Judéia e Samaria, e até os confins da terra: o fato é que no princípio da história da igreja o significado total das palavras de Jesus só foi entendido com muita lentidão, e que, para muitos desses seguidores, tocar nesse assunto eqüivalia a tocar em espinheiro. Mas isto não precisa necessariamente levar-nos a supor que o Senhor jamais lhes deu estas instruções, e que estas lhes teriam chegado posteriormente, por mão de terceiros. A história de Israel, e na verdade a história da própria igreja está cheia de exemplos de como as pessoas não conseguiram atingir os mais nobres ideais de seus líderes.
A forma do enunciado mostra conhecimento íntimo do contexto político e social da época. Aqui, Judéia refere-se àquela parte da Palestina habitada pelos judeus separada de Samaria e da Galiléia (compare At. 9:31; 11:29; 15:1; 26:20; 28:21), e às vezes exclui-se também a Cesaréia (compare 12:19). Politicamente, no entanto, no tempo em que os procuradores governavam de Cesaréia essas províncias, a Judéia era considerada uma província, o que se deduz claramente do texto grego de Lucas, enquanto Jerusalém era sempre considerada pelos rabis como área separada do resto da província, como Lucas também indica não apenas aqui, mas noutras passagens de sua obra (compare 8:1; 10:39; Lc. 5:17; 6:17). A frase até os confins da terra ocorre na Septuaginta em Is. 8:9; 48:20; 49 (compare At. 13:47, onde Paulo usa Is. 49:6 com referência a Barnabé e a si Próprio); 62:11.
Estas palavras contêm o corretivo para a pergunta individualista dos apóstolos no capítulo 1, versículo 6, embora se possa duvidar que eles tenham entendido dessa maneira na época. No máximo talvez entendessem que Jesus lhes estaria ordenando que testemunhassem aos judeus da diáspora e apenas nesse sentido é que pregariam "o arrependimento e a remissão de pecados, a todas as nações" (Lc. 24:47). A idéia de incluir os gentios jamais lhes passaria pela cabeça, e só foi aceita mais tarde com grande dificuldade. O nacionalismo judaico da igreja primitiva demorou muito a morrer. Todavia, à época em que Lucas estava escrevendo, esse nacionalismo extremado em grande parte já era coisa do passado, e a frase "até os confins da terra" havia assumido sentido mais amplo. Abrangia agora o império romano, representado pela própria Roma e, nessa base, Lucas adotou o programa resumido nesse versículo como estrutura de sua narrativa.
Ditas estas palavras, foi Jesus elevado às alturas, à vista deles, e uma nuvem o encobriu dos seus olhos. (Atos 1:9)
Terminados os quarenta dias de instrução, Jesus foi recebido em cima no céu. O grupo havia tomado o caminho familiar através do ribeiro do Cedrom, indo ao monte Olival (compare At.1:12), e em algum ponto nessa área a vida terrena de Jesus chegou ao fim. Visto que os judeus pensavam no céu como estando "lá em cima" e a terra como sendo "aqui em baixo", o desaparecimento de Jesus a caminho do céu, partindo do mundo visível para o invisível, se expressa num "subir". É linguagem que pode não parecer muito apropriada para nós, mas era bastante coerente para os judeus, e encontra-se noutras passagens do Novo Testamento, em conexão com a exaltação de Jesus (veja por exemplo em Ef. 1:20; Fl. 2:9; Hb. 1:3; 2:9). Esse pensamento exprime-se nas palavras: uma nuvem o encobriu dos seus olhos, visto que na linguagem bíblica a nuvem com freqüência é símbolo de glória divina (veja por exemplo em Ex. 16:10; Sl. 104:3). Trata-se de linguagem pitoresca, o evento deve ser retratado mediante imagens; no entanto, Lucas tem certeza de que ocorreu um fato objetivo. Observe a ênfase do autor na visão: Jesus foi tomado de diante dos olhos dos apóstolos: à vista deles e uma nuvem o encobriu dos seus olhos; "e estando eles com os olhos fitos no céu enquanto ele subia" (At. 1:10). Aqui estava um fato importante, porque aqueles homens deveriam testemunhar a ascensão de Cristo, bem como sua vida, morte e ressurreição.
E, estando eles com os olhos fitos no céu, enquanto Jesus subia, eis que dois varões vestidos de branco se puseram ao lado deles e lhes disseram: Varões galileus, por que estais olhando para as alturas? Esse Jesus que dentre vós foi assunto ao céu virá do modo como o vistes subir. (Atos 1:10-11)
A longo prazo a apreciação dos apóstolos acerca da ascensão de Jesus deve ter vindo de uma combinação de visão natural e visão sobrenatural (inspirada), esta última decorrente do ensino primitivo de Jesus. Todavia, deve ter havido concessão suficiente a seus sentidos físicos, de modo que ficassem convencidos de que aquela despedida de Jesus fora final — do Jesus que haviam conhecido corporalmente. Lucas expressa a experiência dos apóstolos em termos dramáticos. Ele se refere a dois homens vestidos de branco que de repente junto deles apareceram (At. 1:10; compare 10:30; 12:7; Lc. 2:9; 24:4). Eles são apresentados com uma exclamação: "olhai" (que não aparece em ECA, mas tem a intenção de transmitir uma idéia de surpresa diante de um fato providencial, visto que Lucas deseja que entendamos que os "dois homens" eram anjos (compare Mt. 28:2 e seguinte; Jo. 20:12).
Não ficou claro o que Lucas entende por "anjos". É possível que tudo que ele queria transmitir fosse um estarrecedor senso da presença de Deus em tudo que estava acontecendo; (compare 7:30; 8:26; 10:3; 12:23; 27:23), de tal modo que os apóstolos se convenceram de que Jesus haveria de voltar da mesma forma como havia partido — isto é: visivelmente — e manifestando a glória de Deus (tudo isso, é evidente, havia sido objeto do ensino de Jesus, compare por exemplo o que diz em Mc. 13:26; 14:62). Entretanto, algum tempo haveria de decorrer antes de seu retorno. Daí a pergunta: Varões galileus, por que estais olhando para as alturas? (At. 1:11). (Parece que a grande maioria dos Doze era constituída de galileus, e que Judas Iscariotes talvez tenha sido a única exceção). Que acatassem as instruções recebidas. No presente, deveriam permanecer em Jerusalém (At. 1:4), a seguir deveriam sair como testemunhas (At. 1:8).
A ênfase aqui, como em geral por todo o Novo Testamento, está nos deveres atuais dos crentes, em vez de nas especulações a respeito da volta de Cristo.
Fontes:
H. Conzelmann, The Theology of Saint Luke
G. Lundstrom, The Kingdom of God in the Teaching of Jesus [O Reino de Deus no Ensino de Jesus]), Edimburgo: Oliver & Boyd, 1963, p. 232
David J. Williams Novo Comentário Bíblico Contemporâneo ATOS

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